Domingo, 05 de outubro de 2025 As investidas golpistas incluíam invocar o Artigo 142 e anistiar os vândalos e demais réus do 8 de janeiro de...
Domingo, 05 de outubro de 2025
As investidas golpistas incluíam invocar o Artigo 142 e anistiar os vândalos e demais réus do 8 de janeiro de 2023
Imagem: Fabio Rodrigues-Pozzebom - Agência Brasil - Arquivo
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Têmis, a deusa grega da Justiça, faz parte da fachada do STF, já foi alvo de vandalismo e tem resistido a ataques contra o Poder Judiciário |
A Constituição Federal do Brasil completa 37 anos, neste domingo (5/10), resistindo a inúmeras investidas golpistas – como ameaças e ataques contra a democracia e ao processo eleitoral – por parte daqueles que deveriam protegê-la por patriotismo e/ou por prerrogativas funcionais e institucionais em vez de tentarem deturpar a sua legalidade ao bel-prazer, para favorecer grupos políticos, e a caprichos egocêntricos e ditatoriais.
Se a Constituição Federal fosse uma mulher de carne osso, muito provavelmente precisaria de medidas protetivas – na forma da Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) – contra seus inúmeros algozes. Bom, felizmente, esse não é o caso pelo simples fato de ela ter inúmeros guardiões, em vez de apenas um, espalhados pelos três poderes republicanos.
Ao mesmo tempo que é atacada numa tentativa de ressignificação para legitimar condutas golpistas e violatórias, a Constituição Federal pode ser invocada para amparar e validar medidas de freios e contrapesos para defendê-la contra extremismos, punir eventuais culpados e garantir o Estado democrático de direito e o pleno funcionamento de suas instituições com poderes harmônicos e independentes.
No decorrer dos últimos anos, houve intentos golpistas de invocar indevidamente o Artigo 142, instando as Forças Armadas a tomarem o poder para que Luiz Inácio Lula da Silva (PT-SP) – legitimamente eleito nas eleições gerais de 2022 – não pudesse assumir a presidência. O plano diabólico incluía até mesmo a possibilidade de assassiná-lo junto a seu vice Geraldo Alckmin (PSB-SP) e o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF). O ápice disso tudo culminou no ataque à sede dos Três Poderes em 8 de janeiro de 2023.
Para além do saudosismo de 21 anos de regime militar, os golpistas [de direita] queriam instaurar uma nova ditadura disfarçada de defesa da democracia e contra a ditadura... da esquerda, além de se resguardarem para controlar o Poder Judiciário e evitar condenações contra si próprios e seus familiares por diferentes supostos delitos. Contudo, e para a sorte do Brasil, são trapalhões demais.
Os golpistas tentaram criar o crime perfeito daquele cujo “filho feio não tem pai”, ou seja, do crime sem culpado, instigando as massas a se rebelarem, utilizando-se da democracia para atacar a democracia, e eles, posteriormente, surgirem como salvadores da pátria para lidar com uma grave crises de vertentes política e social que os permitiria apelar para um estado de sítio ou qualquer outro que o valha.
Embora não seja possível estabelecer um quantitativo, talvez se possa afirmar que vários dos vândalos que depredaram a sede dos Três Poderes não estavam lá exatamente por Jair Bolsonaro (PL-RJ), mas para protestar contra o sistema e tudo o que consideravam injusto, errado ou corrupto. O ex-mandatário personificou essa “vontade popular”, embora não seja um modelo nem um bom exemplo para isso.
O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL-RJ) nunca reconheceu publicamente a derrota para Lula e, em 2022, dias antes de encerrar o mandato, foi para os Estados Unidos dias com a família, não tendo a hombridade de comparecer ao cerimonial para transferir a faixa presidencial. Seu ex-ministro da Justiça Anderson Torres viajou para o mesmo país e lá “perdeu” o celular, quando teve a prisão decretada pelo STF. Quando ocorreram os atos de vandalismo no STF e no Palácio do Planalto, os mais afetados, nenhum dos dois estava no Brasil. Mas nada disso impediu o trabalho meticuloso da Polícia Federal para apurar a responsabilização dos envolvidos.
Uma constituição não é forte por si só sem a independência e a fortaleza das instituições republicanas, que precisam atuar sem ativismo judicial ou político e exercer suas prerrogativas para combater injustiças e mazelas sociais, entre elas a corrupção e a “cupinização” do Estado e suas repartições.
Durante os meses decisivos para o julgamento do núcleo crucial da ala golpista, que resultou na condenação de Jair Bolsonaro (PL-RJ) em 27 anos de prisão e de outros réus, a fortaleza das instituições brasileiras foi fundamental para lidar com intimidações estrangeiras como as proferidas pelo governo do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra ministros da suprema corte. As ameaças e ofensas em redes sociais tinham por objetivo anular o julgamento de tal modo que permitisse o ex-mandatário sul-americano a concorrer novamente em 2026.
Recentemente, os ataques à Constituição Federal e às instituições ganharam novo capítulo com a ala bolsonarista da Câmara dos Deputados aprovando a Proposta de Emenda Constituição das Prerrogativas (PEC) – também chamada popularmente de “PEC da Blindagem” ou “PEC da Bandidagem” –, a qual foi rejeitada e arquivada no Senado.
As investidas de deputados federais não são apenas para se blindarem de eventuais investigações e sentenças por parte do STF, reafirmando o paradigma de que no Brasil “o crime compensa”, mas também visam livrar Jair Bolsonaro (PL-RJ) de sua condenação, com isso atropelando uma decisão judicial e usando como pano de fundo a “pacificação” do país, no intento de aprovar nas duas casas legislativas a PEC da Anistia, renomeada para PEC da Dosimetria com foco na redução das penalidades. No fundo, só estão comprovando que foram a favor do 8 de janeiro, porém falta coragem para admitir.
Durante as mais de três décadas de vigência da mãe de todas as leis – também chamada de Carta Magna –, dois presidentes sofreram impeachment – Fernando Collor de Mello (PRD-AL) e Dilma Rousseff (PT-MG) – e quatro foram presos por diferentes acusações pertinentes ao referido cargo ou não: Michel Temer (MDB-SP), Luiz Inácio Lula da Silva (PT-SP), Fernando Collor de Mello (PRD-AL) e Jair Bolsonaro (PL-RJ).
Mas é a primeira vez na história do Brasil que um ex-chefe de Estado e militares das Forças Armadas são devidamente julgados e condenados por crimes relativos a golpe de Estado. O passado dessa nação mostra que os envolvidos costumam ser perdoados e/ou anistiados como se tivessem cometido meros atos infracionais. Entretanto, dessa vez não conseguiram convencer que se tratasse de um “domingo no parque”.
Nenhuma democracia é perfeita, porque ela depende da conduta de pessoas públicas com distintas ideologias e convicções, as comandam ou ocupam postos determinantes em instituições republicanas. No entanto, é um dos bem mais preciosos que um país pode ter, e isso inclui as liberdades de expressão e de imprensa. Ainda assim, em tese ela precisa reger o senso comum de que todos são livres e iguais em suas diferenças, contanto que isso não se confunda para legitimar atos de intolerância nem de preconceitos.
A Constituição Federal norteia a todas as cidadãs e cidadãs quanto a seus deveres e direitos e precisa ser defendida contra investidas golpistas e chantagens institucionais de um poder sobre o outro, entre elas o eventual trancamento de pautas legislativas de interesse público no intuito de forçar a barra para aprovar medidas específicas a determinados nichos políticos ou para validar a impunidade como “generosidade”.
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