Sexta-feira, 31 de outubro de 2025 Para María Corina Machado, o mandatário brasileiro fracassou em todas as suas tentativas anteriores de ne...
Sexta-feira, 31 de outubro de 2025
Para María Corina Machado, o mandatário brasileiro fracassou em todas as suas tentativas anteriores de negociação com o governo de Nicolás Maduro
Imagens: María Corina: Redes Sociais / Lula: Ricardo Stuckert - Redes Sociais - Arte: Opinólogo /
Qualidade das fotos melhorada com inteligência artificial
![]() |
| Lula perdeu a credibilidade de ser um mediador da oposição venezuelana |
Preocupação com ingerência estrangeira
A ex-deputada venezuelana María Corina Machado – ganhadora do Nobel da Paz 2025 – criticou o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT-SP), por querer mediar a crise diplomática entre Estados Unidos (EUA) e Venezuela devido a fracassos em interlocuções anteriores. A declaração foi feita por videoconferência, nessa quinta-feira (30/10), durante entrevista coletiva aos portais El Pitazo, Runrunes e Tal Cual.
“Bom, em primeiro lugar me surpreende muito essa proposta, porque depois de mais um ano com cinco reféns na Embaixada da Argentina, sob a proteção do Brasil, o governo do presidente Lula não conseguiu sequer cinco salvos-condutos. Depois de seis meses sem luz, não conseguiu que colocassem um fusível. E depois de mais de 15 meses pedindo as atas [eleitorais] originais, não logrou que [Nicolás] Maduro as entregasse. Então, não sei o que o presidente Lula acha que poderia conseguir nesse momento. Agora, algo que sempre me pareceu muito grave é que aqui as duas partes que ele menciona são Estados Unidos e o regime de Maduro. Vocês não acham que está faltando a parte mais importante? Onde estão os venezuelanos ou será que na análise do presidente Lula os venezuelanos não importam?”, criticou.
A indignação da ativista venezuelana – principal adversária do regime bolivariano – se deve ao fato de o petista ter reforçado, durante viagem à Malásia na semana passada, a intenção de mediar as conversas entre os presidentes dos Estados Unidos, Donald Trump, e o da Venezuela, Nicolás Maduro.
As palavras de María Corina Machado passam a ter novo peso, porque agora é uma laureada do Nobel da Paz quem se expressa, não mais uma mera inimiga política do bolivarianismo tratada como ‘traidora da pátria’.
O mandatário brasileiro está preocupado com a mobilização de navios militares norte-americanos para a costa caribenha, com os constantes bombardeios a embarcações de suspeitos por narcotráfico nas últimas semanas e com o risco real de haver uma invasão por terra para tentar destituir o ditador venezuelano, e que isso se torne precedente para ações semelhantes em outros países.
Explicando as críticas de María Corina Machado
As críticas da ganhadora do Nobel são pertinentes, tendo em vista a excelente relação diplomática e ideológica entre Lula e Nicolás Maduro. Apesar do carisma e notabilidade na comunidade internacional, esperava-se que o petista pudesse usar sua influência para convencer o amigo a seguir outra postura. Tal amizade não trouxe nenhum tipo de vantagem à oposição.
Em agosto do ano passado, o governo brasileiro assumiu temporariamente a responsabilidade de cuidar da Embaixada Argentina em Caracas, na Venezuela, a pedido do governo de Javier Milei. Diplomatas argentinos foram expulsos do país, porque a Casa Rosada rejeitou o resultado da eleição que reconduziu Nicolás Maduro ao cargo. Na ocasião, cinco opositores do regime estavam asilados no imóvel.
Os hóspedes da diplomacia argentina não conseguiam deixar o local por falta de salvo-conduto por parte das autoridades venezuelanas. Somente em maio de 2025, foram resgatados durante uma missão do governo estadunidense.
Em março, julho e novembro de 2024, o fornecimento de energia elétrica na sede diplomática argentina em Caracas foi cortado pelo regime do presidente venezuelano. O transtorno se prolongou por meses.
Lula ficou contra a parede após a reeleição de Maduro em julho do ano passado. Para manter sua postura de democrata e evitar constrangimento dentro e fora do Brasil, o Itamaraty nunca se posicionou oficialmente sobre a vitória de seu aliado. Publicamente, cobrava a apresentação das atas eleitorais para poder então confirmar o êxito de seu homólogo.
A postura do governo brasileiro tem duplo viés: por um lado, preserva-se o pragmatismo de uma diplomacia que busca se colocar como interlocutor neutro para poder mediar com diferentes espectros políticos; por outro, é uma tangente protecionista tanto para preservar as relações internacionais quanto para ‘passar pano’ aos eventuais abusos e violações de direitos dos povos sob os mantras da soberania e da autodeterminação dos povos.
Enquanto os governos brasileiro, colombiano e mexicano tentaram se colocar como mediadores e nunca admitiram publicamente a reeleição de Maduro, o Partido dos Trabalhadores (PT) – do qual Lula é filiado – foi em direção oposta e felicitou os venezuelanos por sua ‘jornada pacífica, democrática e soberana’. Essa pode ter sido uma saída para minar ainda mais os laços diplomáticos entre os palácios do Planalto e o de Miraflores.
Maduro nunca apresentou oficialmente essas atas. Em vez disso, apelou ao Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) para validar o resultado do pleito e pressionou os candidatos concorrentes a reconhecerem a legalidade do processo político. O único que não se sujeitou a essa farsa política foi Edmundo González, seu principal concorrente apoiado pela ex-parlamentar sul-americana.
A oposição venezuelana, liderada por María Corina Machado, logrou 79% desses comprovantes eleitorais e os divulgou para demonstrar que o suposto vencedor seria, de fato, Edmundo González, o que reforçava ainda mais as suspeitas de fraude por parte do governo bolivariano.
Logo após a reeleição de Maduro no ano passado, Lula se colocou com interlocutor ante o então presidente norte-americano, Joe Biden, em fase anterior da crise entre Estados Unidos e Venezuela. A iniciativa tinha como objetivo criar distração política para evitar ingerência estrangeira sobre a tal soberania dos povos.
Em 2023, o governo Biden suspendeu sanções econômicas contra a Venezuela por um período de seis meses, contanto que Maduro atuasse para promover reformas políticas e permitisse que líderes opositores pudessem disputar as eleições. Em vez disso, pré-candidatos relataram dificuldades e imposições praticadas por órgãos institucionais.
O Brasil de Lula não quer ser mero espectador e tenta se reafirmar como árbitro global nessa crise entre Estados Unidos e Venezuela. Contudo, sua proximidade com Maduro põe em xeque a neutralidade, tendo em vista que o tema também é de interesse do gigante sul-americano.


COMMENTS