Sábado, 14 de janeiro de 2017 Entidades ligadas ao agronegócio se sentiram agredidas com o samba-enredo que será apresentado pela agremi...
Sábado, 14 de janeiro de 2017
Entidades ligadas ao agronegócio se sentiram agredidas com o samba-enredo que será apresentado pela agremiação carioca; parlamentar quer abrir CPI contra a Imperatriz
Entidades ligadas ao agronegócio se sentiram agredidas com o samba-enredo que será apresentado pela agremiação carioca; parlamentar quer abrir CPI contra a Imperatriz
‘Vamos brincar de índio,
mas sem mocinho pra me pegar
venha pra minha tribo
eu sou o cacique
você é meu par.
Índio fazer barulho
índio ter seu orgulho
vem pintar a pele para a dança começar (...)’.
A polêmica
Imagem: Imperatriz Leopoldinense /
Reprodução
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A polêmica fantasia que causou a ira de entidades do agronegócio |
Este é o trecho que está incomodando ruralistas:
‘(...) Sangra o coração do meu brasil
o belo monstro rouba as terras dos seus filhos
devora as matas e seca os rios
tanta riqueza que a cobiça destruiu
sou o filho esquecido do mundo
minha cor é vermelha de dor
o meu canto é bravo e forte
mas é hino de paz e amor (...)’
Reação de setores do agronegócio
Para a Associação Brasileira de Criadores de Zebu (ABCZ), por exemplo, o tema ‘mostra total despreparo e ignorância quanto à história brasileira e a realidade econômica e social do país’.
“(...) Antes de mais nada, é preciso esclarecer e reforçar que o país do samba é sustentado pela pecuária e pela agricultura. Chamados de ‘monstros’ pela escola, nós, produtores rurais, respondemos por 22% do PIB Nacional e, historicamente, salvamos o Brasil em termos de geração de renda e empregos. Com o tempo e com o nosso talento de produzir cada vez mais – e de forma sustentável – trouxemos para nossa nação o título de campeã mundial de produção de grãos e de proteína animal.
Inaceitável que a maior festa popular brasileira, que tem a admiração e o respeito da nossa classe, seja palco para um show de sensacionalismo e ataques infundados pela Escola Imperatriz Leopoldinense. O setor produtivo e a sociedade não podem ficar calados diante a essa injustiça. É preciso que o Brasil e os brasileiros não só enxerguem e reconheçam a importância do nosso setor, como se orgulhem dessa nossa vocação de alimentar o mundo (...)”, declarou a ABCZ.
Para a Confederação Nacional dos Engenheiros Agrônomos do Brasil (Confaeb), a Imperatriz Leopoldinense teria sido ‘infeliz’ em suas pesquisas sobre o tema, por generalizar o produtor rural, não separando ‘o joio do trigo’. Para a entidade, trata-se de uma campanha de desinformação e de um crime de ‘lesa pátria’.
“(...) A classe agronômica nacional, composta por profissionais comprometidos com um AgroBrasil desenvolvido com responsabilidade econômica, social e ambiental, que participa intensamente do processo produtivo responsável, sendo protagonista desta jornada de sucesso do agronegócio, seja ele de base empresarial ou familiar, não poderia deixar de manifestar seu repúdio à equivocada proposta da Imperatriz Leopoldinense (...)”, disse a Confaeb, que lembrou que o setor é responsável por 37% dos empregos no país.
A escola de samba se defende
Imagem: Imperatriz Leopoldinense /
Cedida ao OPINÓLOGO /Reprodução
Cedida ao OPINÓLOGO /Reprodução
“Eu quero esclarecer pra todo o segmento do agronegócio, que nunca foi intenção da Imperatriz [Leopoldinense] agredir vocês. Como pode uma escola que exalta o agronegócio no carnaval anterior, quando na ocasião fizemos uma homenagem à dupla sertaneja Zezé de Camargo e exaltamos o homem do campo, o caipira que trabalha e leva alimento pra mesa do brasileiro??? Então, seria um pouco estranho a escola neste ano atacar o agronegócio. Então, quero deixar claro que nunca foi intenção da Imperatriz agredir o agronegócio com esse tema. O que aconteceu foi um grande equívoco e uma má interpretação por parte de vocês, que pegaram uma ala que tem o título de ‘Fazendeiros e Agrotóxicos’, na qual nós apontamos ali os riscos que o uso indevido do agrotóxico causa à vida do índio e do ser humano, quando a gente cita no enredo, em especial no samba, que foi questionado o trecho ‘sangra o coração do meu brasil, o belo monstro rouba as terras dos seus filhos, devora as matas e seca os rios’, nós queremos fazer um alerta à Hidrelétrica de Belo Monte, e não ao agronegócio. Então, houve um grande engano por parte de todo o segmento do agronegócio, que pegou a ala do agrotóxico e esse pedaço do samba, e vestiu uma carapuça e deduziu ali que escola estaria fazendo um movimento contra o agronegócio (...)”, se defendeu o carnavalesco.
“Gente, nós sabemos o quanto o agronegócio é importante pra economia brasileira. Então, nós nunca seríamos capazes de agredir um segmento tão importante pro Brasil (sic). Quando decidimos falar sobre o índio, em especial sobre a importância da reserva do Parque Indígena do Xingu, nosso objetivo não é outro, senão fazer um alerta sobre os riscos que ainda ameaçam as 16 etnias que ali resistem e, indiretamente, muitas outras espalhadas pela Amazônia (...)”, continuou Cahê Rodrigues.
Vídeo: Imperatriz Leopoldinense / Cedido ao OPINÓLOGO
Em defesa, o carnavalesco exalta a luta da escola contra o preconceito
Em nota enviada ao OPINÓLOGO e comumente respondida à imprensa , o presidente da Imperatriz Leopoldinense, Luiz Drumond, considerou ‘injustas’ as críticas e disse que a escola é alvo de uma campanha ‘difamatória’.
“Após a divulgação de nossas fantasias, algumas delas denunciando o uso irresponsável de agrotóxicos, fomos alvo de uma intensa campanha difamatória. Embora não seja nossa intenção generalizar, importantes pesquisas científicas apontam os diversos males que o agrotóxico traz para o solo, para o alimento e consequentemente para a saúde de quem o consome. Este é apenas um aspecto do nosso rico e imenso enredo, mas desde então temos recebido críticas e inúmeras notas de repúdio dos mais diversos setores do agronegócio”, argumentou o líder da escola.
“(...) Ressaltamos e esclarecemos que no trecho de nosso samba ‘o Belo Monstro rouba a terra de seus filhos, destrói a mata e seca os rios’, estamos nos juntando às populações ribeirinhas, às etnias indígenas ameaçadas, aos ambientalistas e importantes setores da sociedade que se posicionaram contra a construção da usina Hidrelétrica de Belo Monte. Não é uma referência direta, portanto, ao agronegócio, como alguns difundiram. Os impactos negativos desta obra ao meio ambiente serão imensuráveis, estão constantemente nas pautas de debates, são temas de discussões recorrentes em audiências públicas e foram amplamente divulgados pela imprensa nacional e estrangeira”, explicou o dirigente.
“Vamos falar da rica contribuição dos povos indígenas do Xingu à cultura brasileira e ao mesmo tempo construir uma mensagem de preservação e respeito à natureza e à biodiversidade. Acreditamos que, para além do entretenimento, o carnaval e a escola de samba – levando em consideração que os olhos do mundo se voltam para nossa festa – têm um compromisso com o social e o desenvolvimento sustentável”, complementou Luiz Drumond.
Parlamentar propõe investigar a escola de samba
O samba-enredo da ‘Rainha de Ramos’, como é chamada a agremiação, oito vezes campeã da série especial, também foi criticado pelo senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), quem prometeu criar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar quem seriam os patrocinadores e por que a escola ‘denigre’ o agronegócio.
“Assim que retornarem as atividades legislativas vou buscar a realização de sessão temática para discutirmos em plenário os motivos que levaram a Imperatriz Leopoldinense a autorizar um samba-enredo que denigre a imagem do agronegócio, único setor, que diante de uma crise devastadora, deverá ser superavitário. Há tantos graves problemas que o país passa, como a violência, o tráfico de drogas, as facções criminosas e uma escola de samba se ocupa em difamar o setor que deveria ser enaltecido e homenageado na Marquês de Sapucaí”, manifestou o parlamentar nas redes sociais.
A atitude do parlamentar pode parecer supostas tentativas de censura e de intimidação, ainda mais se levado em conta que entre seus doadores de campanha de 2014 estão empresas e empresários do ramo.
Segue a letra completa do samba-enredo:
‘Brilhou… a coroa na luz do luar!
nos troncos a eternidade… a reza e a magia do pajé!
na aldeia com flautas e maracás
kuarup é festa, louvor em rituais
na floresta… harmonia, a vida a brotar
sinfonia de cores e cantos no ar
o paraíso fez aqui o seu lugar
jardim sagrado o caraíba descobriu
sangra o coração do meu Brasil
o belo monstro rouba as terras dos seus filhos
devora as matas e seca os rios
tanta riqueza que a cobiça destruiu
sou o filho esquecido do mundo
minha cor é vermelha de dor
o meu canto é bravo e forte
mas é hino de paz e amor
Sou guerreiro imortal derradeiro
deste chão o senhor verdadeiro
semente eu sou a primeira
da pura alma brasileira
Jamais se curvar, lutar e aprender
escuta menino, raoni ensinou
liberdade é o nosso destino
memória sagrada, razão de viver
andar onde ningúem andou
chegar aonde ninguém chegou
lembrar a coragem e o amor dos irmãos
e outros heróis guardiões
aventuras de fé e paixão
o sonho de integrar uma nação
kararaô… kararaô… o índio luta pela sua terra
da imperatriz vem o seu grito de guerra!
Salve o verde do Xingu… a esperança
a semente do amanhã… herança
o clamor da natureza
a nossa voz vai ecoar… preservar! ’
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