Sábado, 27 de junho de 2015 Os 'brasiyankees' Uma onda contagiante tomou conta de inúmeros perfis no facebook em várias par...
Sábado, 27 de junho de 2015
Os 'brasiyankees'
Uma onda contagiante tomou conta de inúmeros perfis no facebook em várias partes do mundo, como também no Brasil, nessa sexta-feira (26/6), em comemoração à decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos, que torna legal o matrimônio civil entre pessoas do mesmo gênero em todo o país. Por meio de um aplicativo criado por essa rede social, era possível mesclar a foto de perfil com a da bandeira LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transexuais) com as cores do arco-íris.
Vale destacar a similitude da legalização do casamento gay tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos. Nos dois casos, não houve aprovação do Congresso. Portanto, não há uma lei. Foi preciso que instâncias jurídicas entrassem no assunto. Lá, os estados têm autonomia para decidir certos temas, tanto que apenas 13, dos 50, resistiram à aprovação de uma legislação em seus parlamentos.
Em 2010, a Argentina foi o primeiro país da América Latina a aprovar pelo Congresso o casamento gay. O Uruguai, nos últimos anos, têm dado constantes provas de laicidade: legalizou a união homoafetiva, o aborto e as drogas. Esta última poderia ser considerada um fracasso na luta contra o narcotráfico, mas isso é discussão para outro momento. Mesmo assim, os acontecimentos não tiveram tanta repercussão nas mídias sociais no Brasil.
Parlamentares insistem na 'cura gay'
Enquanto brasileiros olham para a janela do vizinho e se esquecem do próprio quintal, deputados federais ligados à bancada evangélica criaram um 'circo' – por meio de uma audiência pública –, na última quarta-feira (24), com o intuito de reacender a discussão sobre a Resolução nº 01/1999 do Conselho Federal de Psicologia (CFP), que proíbe aos psicólogos a realização de tratamento de cura da homossexualidade. Reuniram alguns autointitulados ex-homossexuais para falar de suas experiências e do preconceito que continuam sofrendo. Esta resolução se baseia numa decisão da Organização Mundial de Saúde (OMS), que orienta as nações a não considerar a homossexualidade uma doença.
A audiência – realizada na Comissão de Direitos Humanos e das Minorias (CDHM) – foi solicitada pelo ex-presidente dessa comissão, o deputado federal pastor Marco Feliciano (PSC-SP). “Como é que um conselho resolve algo que vai influenciar na vida de milhares de pessoas sem passar por esta Casa?”, indagou.
Parlamentares evangélicos só esperaram uma nova legislatura para insistirem com o tema. Em 2013, devido à forte pressão popular provocada pela onda de protestos que tomou conta do país, a Câmara teve de arquivar o Projeto de Decreto Legislativo nº 234/2011, do deputado federal evangélico João Campos (PSDB-GO), que anulava dois artigos da supracitada resolução. Seu projeto foi apelidado de 'cura gay'. Portanto, não poderia ser novamente discutido até 2015.
“O que está colocado aqui é uma estratégia de um grupo de deputados que quer reacender esse debate para derrubar essa resolução que trata da forma como nós da Psicologia entendemos que o exercício profissional deva ser colocado”, opinou o vice-presidente do CFP, Rogério de Oliveira Silva.
“Sustentei que o CFP diminuía o profissional de Psicologia com a norma. Não cabe ao conselho limitar o livre exercício da profissão”, criticou o deputado João Campos, em alusão à Resolução 1/99 do órgão. O parlamentar também defendeu que as instituições religiosas acolhessem ex-gays.
“Nós na Psicologia não somos contrários ao sofrimento das pessoas que nos procuram. O que ocorre é uma confusão, é que não podemos, no exercício profissional, partir do pressuposto de que vamos fazer o tratamento de algo que não é considerado como doença”, rebateu o vice-presidente do CFP, ao salientar que o psicólogo não deve impor suas ideologias e crenças aos pacientes.
Para Marisa Lobo, psicóloga especialista em Saúde Mental e Filosofia de Direitos Humanos, os 'programas de televisão ridicularizam os ex-homossexuais, porque não sabem como são por dentro'. “Essas pessoas são seres humanos e devem ser respeitadas”, disse.
Relatos de ex-homossexuais
“Antes ele (o homossexual) era discriminado pela sociedade heterossexual e agora ele é tanto pela hétero, que não acredita nele, como pela sociedade LGBT, que também não acredita, e porque a maioria das pessoas deixou a homossexualidade a partir da experiência religiosa”, afirmou Claudemiro Soares Ferreira, especialista em políticas sobre drogas e mestre em Saúde Pública. Ele também seria um ex-gay.
“Para desconstruir a homossexualidade no meu processo, eu precisava entender quem eu era. Alguém me ajudou a tratar os gatilhos que me levaram à homossexualidade”, comentou o pastor e radialista Arlei Lopes Batista. Ele relatou que até os três anos de idade, a mãe o vestia de menina, pois durante a gravidez desejava ter uma filha.
Já para o pastor e cantor Robson Alves, falta ajuda psicológica para quem vive um relacionamento homossexual, e ainda assim não se sente feliz. “Recebi indicação da psicóloga para viver minha homossexualidade, mas eu não era feliz. A pessoa que quer deixar de ser homossexual, ela pode deixar”, contou.
O pastor Joide Pinto Miranda relatou ter sofrido abusos dos 6 aos 7 anos de idade. Justificou sua homossexualidade pela ausência paterna. “Aos seis anos fui abusado por um advogado, tentei contar para o meu pai, mas ele não tinha tempo para mim”, disse. Aos 12 anos, saiu de casa e foi atuar como travesti em São Paulo e depois na Europa. “Nunca fui doente quando era homossexual, mas tinha a alma dilacerada. Na verdade eu nunca fui gay, nasci hétero, mas a vida me levou para esse caminho”, complementou, ao falar que largou a profissão e retornou ao país em atenção a um pedido da mãe.
A radialista e estudante de Psicologia Raquel Guimarães afirmou ter sido abusada sexualmente dos 8 aos 15 anos. “Passei a rejeitar a imagem de homem. Não me sentia bem e não conseguia ver um futuro feliz ao lado de um homem”, relatou, também, que aos 11 anos de idade, começou a sentir atração por mulheres.
“O abuso sexual de uma menina, de um menino leva obrigatoriamente a ter um comportamento homossexual? Definitivamente, disso não há prova”, questionou o deputado federal Adelmo Carneiro Leão (PT-MG). Ele também criticou a generalização para a causa da homossexualidade, que foi atrelada a relatos de abusos sexuais.
O deputado federal Marcos Rogério (PDT-RO), suplente na CDHM, criticou o Estado brasileiro de financiar cirurgias de mudança de sexo pelo Sistema Único de Saúde (SUS), mas não oferecer nenhum programa para quem quiser deixar de ser gay ou lésbica, por exemplo.
O deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) reclamou o fato de a audiência ter sido presidida pelo presidente da CDHM, deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS), quem é defensor dos direitos LGBT. Note-se que o parlamentar carioca não fez nenhuma objeção quando Feliciano – evangélico – presidia essa comissão, em 2013, que na ocasião também implicava com a resolução do CFP.
O deputado federal Sóstenes Cavalcanti (PSD-RJ) criticou a ausência de seus homólogos Jean Wyllys (Psol/RJ) e Érika Kokai (PT-DF), ambos ativistas pró-LGBT. O parlamentar foi eleito com o apoio do pastor Silas Malafaia, da Igreja Assembleia de Deus Vitória em Cristo (Avec).
Nessa quinta-feira (25), o líder da Avec participou de uma audiência realizada por uma comissão especial que analisa o Projeto de Lei nº 6.583/2013, que cria o Estatuto da Família. “Se a Constituição diz que família é homem e mulher, então mude a lei é só isso. Não adianta vir com caneta de juiz para tentar conquistar um direito. Direitos se conquistam no Parlamento por meio da democracia e da discussão das ideias”, expressou.
Vale frisar que o texto do Estatuto da Família é do deputado federal Anderson Ferreira (PR-PE). Evangélico, atuou como relator na CDHM, em 2013, quando tramitava o projeto de 'cura gay'. O parlamentar busca impor sua crença, em detrimento ao Estado laico, ao propor também a obrigatoriedade no currículo do Ensino Fundamental a disciplina 'Educação para a Família'. Ademais, sugere que os colégios públicos e privados passem a celebrar o dia 21 de outubro como o Dia Nacional de Valorização da Família.
Breve análise
Mais do que estar preocupados com o fiofó alheio, parlamentares da bancada evangélica parecem não respeitar as vozes das ruas, que os obrigaram a engavetar definitivamente qualquer projeto ligado à cura da homossexualidade. Querem impor seu fundamentalismo religioso contra o Estado laico.
Por meio da audiência que reuniu supostos ex-homossexuais, buscaram tangenciar uma questão que deveria estar resolvida. Tentam intrometer-se em assuntos que não os competem como na supramencionada resolução do Conselho Federal de Psicologia. Cabe a esta entidade regulamentar e fiscalizar seus profissionais, não um bando de leigos, que buscam dar viés legal ao que chamam de discussão com um grupo de entes com pensamentos afins.
+(FACULDADE+BLOCO+B+3)+!!!.jpg)
COMMENTS