Quarta-feira, 01 de outubro de 2025 Duas unidades de saúde no Rio são fechadas por conta da violência e risco aos profissionais de saúde e p...
Quarta-feira, 01 de outubro de 2025
Duas unidades de saúde no Rio são fechadas por conta da violência e risco aos profissionais de saúde e pacientes; ônibus são usados como barricadas; Justiça Eleitoral cogita alterar locais de votação situados em favelas
Alguns casos
Imagem: Divulgação
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O uso de coletivos por traficantes como barricadas já se tornou comum |
O aumento da criminalidade no Brasil, marcado por táticas cada vez mais ousadas por parte de narcotraficantes e milicianos, pode ser usado como termômetro para refletir a escalada de violência e o fracasso nas políticas de segurança pública, principalmente nas grandes metrópoles. São inúmeros casos que já banalizaram e que já fazem parte do cotidiano de milhões de pessoas, e isso não é apenas no Rio de Janeiro ou em São Paulo. Cidades como Fortaleza, João Pessoa, entre outras, também são impactadas.
Na capital fluminense, por exemplo, a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Costa Barros, na Zona Norte, está fechada desde ontem (30/9) e sem previsão de reabertura, depois que traficantes armados invadiram o estabelecimento durante o final da madrugada em busca de supostos baleados de facção adversária. Na ocasião, profissionais de saúde foram ameaçados e agredidos e dois pacientes, confundidos com rivais, sequestrados e posteriormente liberados. Após a invasão, criminosos teriam passado em frente a unidade de saúde. Por conta disso, 11 pacientes tiveram de ser transferidos para o Hospital Municipal Ronaldo Gazolla, no bairro vizinho de Acari.
Em Madureira, bairro próximo na Zona Norte, o Hospital Maternidade Carmela Dutra precisou ser fechado, nesta quarta-feira (1/10), após um homem – cuja identidade não foi divulgada – ter sido achado morto com sinais de tiros. A medida visava proteger trabalhadores da saúde e pacientes.
Também nessa terça-feira (30), três ônibus foram sequestrados (foto) e utilizados como barricadas por criminosos na Estrada dos Bandeirantes, em Jacarepaguá, bairro que agora faz parte da nova Zona Sudoeste do Rio. Para dificultar a retirada dos veículos pela polícia, os marginais roubaram as chaves. Além do trânsito impactado, sete linhas tiveram seus itinerários alterados. Apenas em 2025, mais de 100 coletivos foram usados por bandidos no mesmo modus operandi, na “Cidade Maravilhosa” para impedir ou atrapalhar operações policiais.
Durante uma reunião realizada na sexta-feira passada (26), o Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) cogitou a possibilidade de transferir o local de votação de eleitores que vivem em áreas dominadas por facções criminosas e milícias já para o pleito de 2026, noticiou o jornal O Globo. O objetivo seria evitar influência e coação por parte de grupos criminosos para que os moradores votem em seus candidatos.
Vale frisar que nas eleições municipais de 2024, por exemplo, vários cidadãos tiveram seus colégios eleitorais modificados. Em outras favelas, as urnas eletrônicas tiveram de ser levadas em veículos blindados – popularmente chamados de “caveirões” – da Polícia Militar.
No último dia 6 de setembro, uma mulher foi internada num hospital em João Pessoa, na Paraíba, após ser agredida por outras quatro mulheres, supostamente, a mando de traficantes, como punição por ela ter denunciado o companheiro por delito de violência doméstica, de acordo com a TV Cabo Branco.
Breve análise
Esses são alguns episódios recentes e aleatórios escolhidos por Opinólogo para ilustrar a [in]segurança pública e a crise que prejudica o direito de ir e vir dos brasileiros, não só os que residem em comunidades como também os que vivem fora delas. A vitória do crime organizado é a derrota da população, que tem, constantemente, seus direitos básicos cerceados de distintas maneiras: falta de acesso a serviços públicos como telefonia e internet; linhas de ônibus alteradas; dificuldade para solicitar carros por aplicativos, porque os motoristas têm medo de assaltos e extorsões; sobrepreço em produtos como gás de cozinha, água mineral, entre tantos outros. E tudo isso é conhecido tanto pela população quanto pelo poder público, mas nada é solucionado ou devidamente combatido.
O caso da mulher vítima de violência doméstica na Paraíba demonstra o quão surreal chegou a conduta de criminosos, que querem silenciá-la e impedi-la de se proteger de um eventual feminicídio.
Não bastassem todos esses abusos contra habitantes de periferias, muitos perderão o simples direito de votar perto de casa, tendo de enfrentar longas filas, porque o dever ao exercício de cidadania é comprometido por organizações criminosas. Tudo isso sem contar os candidatos que são impedidos de fazer campanha nessas localidades, mas isso é assunto para outro momento e que precisa ser abordado em detalhes.
Ações de inteligência são fundamentais para coibir e enfrentar o crime organizado, de modo a evitar que cidadãos inocentes sejam atingidos por tiros durante uma operação policial, por exemplo. Contudo, essas iniciativas precisam estar atreladas a investimentos, capacitação de agentes, melhorias salariais, combate à corrupção nas instituições públicas e modernização nas legislações para resguardar as polícias, ao Poder Judiciário e ao Ministério Público a atuarem de forma mais efetiva e combativa.
De modo geral e por força da lei, a polícia é obrigada a ter limites, mas o bandido não. Aí, está toda a diferença no enfrentamento à violência urbana, cuja linha tênue está nos direitos humanos que o Estado precisa garantir no amplo direito à defesa e à garantia da dignidade de suspeitos. Isso ajuda a explicar a indignação de cidadãos críticos aos direitos humanos, que reclamam que os moradores de favelas denunciam a polícia, mas não têm coragem de fazer o mesmo com meliantes.
Somente a educação não será capaz de transformar a sociedade, porque tais investimentos seriam direcionados às futuras gerações, o que levaria décadas, quando as circunstâncias exigem políticas concomitantes para lidar hoje com a dura e crua realidade.
Cidadãos brasileiros não são reféns apenas de traficantes e milicianos, mas também do próprio sistema – e isso inclui as instituições e a classe política –, que é burocrático e moroso. Muitas vezes, criminosos sem quaisquer perspectivas de ressocialização, e com uma vasta ficha criminal, têm permitida a “saidinha temporária” e não regressam às penitenciárias, gerando gastos para o Estado pela recaptura e mudança de foco das polícias, que deveriam estar concentradas em outras iniciativas e investigações, mas precisam consertar lambanças cometidas pela falta de bom senso e em nome da legalidade.
É preciso explicitar que o combate à criminalidade é de responsabilidade dos governos estaduais, e que a atuação da União é a de somar forças, oferecer mecanismos aos estados e atuar no combate a crimes interestaduais e em zonas fronteiriças.
E por falar em criminalidade, é risível que o Brasil insista no “mantra” de algum dia ocupar um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU), ao lado de Estados Unidos, Reino Unido, França, China e Rússia, por exemplo. O país sul-americano sequer consegue fazer seu dever de casa para garantir a segurança em solo doméstico nem impedir o avanço de organizações criminosas, algumas delas com presença no exterior.
Entre 2004 e 2017, o Brasil liderou a Missão de Paz da ONU para o Haiti (Minustah), quando o país centro-americano lidava com graves crises política e social. E diga-se de passagem, foi um fiasco: mais de duas mil denúncias de crimes de violência sexual – 300 delas envolvem crianças –, supostamente, cometidos por soldados dos países que integravam a missão. Em 2005, uma operação das forças militares estrangeiras deixou 27 civis mortos, sendo 20 das vítimas mulheres adolescentes. O episódio é conhecido como Massacre Cité Soleil.
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